O Demônio e o Anjo
De longe, sentado sobre um sofá de couro negro rasgado e deteriorado pelo tempo, dentro de uma casa abandonada em frente a este fatídico prédio, lá estava ele. Olhando a movimentação dos carros de polícia e das ambulâncias, que não paravam de ir e vir, retirando os corpos dos infelizes. Foi um massacre.
Noite passada ele lembrou, como o gosto da carne ainda estava em sua boca. Não tinha culpa. Aquilo fora pedido. Aquilo fora cobrado dele. Todas aquelas pessoas não mereciam morrer, somente uma parcela. Porém, quando a raiva chega não há controle.
E ele se lembrava de cada momento que havia passado até então.
O dia se iniciava para um garoto chamado Bruno. Sentado à mesa da cozinha comendo um delicioso café da manhã preparado com carinho e dedicação por sua mãe. O nome dela era Débora. Os dois moravam sozinhos desde o falecimento misterioso de seu pai, Marcos.
A mesa estava posta com o famoso bolo de chocolate dela, e com suco de laranja. Bruno se deliciava. Ele comia muito no café.
Iria chegar atrasado na escola. Mas, nem ele nem sua mãe ligavam para isso, após a conversa que tiveram noite passada, ela saberia que pela decisão de seu filho, logo teriam que mudar de cidade novamente.
Bruno decidiu que já estava na hora de ir para o colégio, teria perdido a primeira aula.
"Dane-se"- pensou.
Abraçou a mãe e saiu. Dentro do bolso de sua calça azul do uniforme, tinha seu celular e no lado direito seu Ipod.
Em sua mochila estava o caderno e o livro de história. Ele adorava essa matéria. Como adorava.
Estava ouvindo uma de suas bandas favoritas "Ozzy Osbourne". A música era "Bark at the moon ".
Tinha uma ligação especial com aquele som.
Continuou sua caminhada. Ainda tinha vinte minutos pela frente.
Parou na porta do colégio. Desligou seu Ipod. Guardando-o em sua bolsa. Respirou fundo. Tomando coragem para adentrar aquele lugar.
Passou pelo corredor, andando calmamente, sabia aonde era sua sala. Segundo andar no fim do corredor de frente para o hall onde ficavam os banheiros. Era um lugar interessante. As cores da escola eram claras, e era um local bem arborizado.
Wagner parou e pensou, ele ainda tinha que passar na direção para pegar sua autorização para entrar em aula.
Voltou, então pelo mesmo corredor, indo em direção à sala do diretor, na verdade da diretora, seu nome era Rosangela. Era a dama de ferro.
Rosangela estava sentada em sua mesa, lendo um relatório feito por um professor sobre o acompanhamento dos alunos na disciplina de matemática II. Estava entretida com toda a baboseira imensa escrita ali, porém, foi interrompida com o barulho de alguém batendo na porta. Era Giane, sua secretária trazendo consigo, Bruno, atrasado com todos os dias.
"Mais um atraso Bruno, até quando você ira ficar assim?" – Reclamou.
"Não muito mais" - Disse.
"Ok, essa foi a última, depois quero falar com sua mãe!" – falou Rosangela irritada. – Aqui está sua autorização.
Bruno saiu da sala, com a cabeça erguida, e no fundo, realmente ele nunca voltaria a se atrasar. Contudo, também, a diretora não poderia falar com sua mãe. Débora adoraria tê-la para o jantar.
Estava agora encostado na parede em frente a sua sala. Olhando para o professor de Geografia, Geraldo. Era uma das aulas mais chatas existentes para ele, além de Geometria.Como odiava aqueles malditos triângulos.
O horário havia passado, agora era a aula de história. Bruno se adiantou e entrou na sala. Todos o olhavam, era parte do ritual nesse colégio.
Sentou-se no fim da sala. Esperando ansioso pelo professor. Logo sua espera passou quando Cezar, o professor da matéria, entrou na sala.
"Bom dia" - Disse, examinando toda a sala.
***
O dia havia passado corriqueiro, e cheio de empecilhos como de costume.
A aula no período da tarde, Educação Física.
Bruno era um rapaz fora de seu peso, não tinha o mínimo porte atlético, mas muitas vezes conseguia ser mais rápido, e mais forte que quase todos os babacas atletas da escola toda. Ninguém imaginava como aquele rapaz gorducho tinha tanta energia e fôlego.
Estava sentado na arquibancada esperando algum dos times que estavam sendo montados escolherem-no para participar. Mais uma das coisas que odiava, tinha que participar para ter nota.
Logo, o último time feito com os alunos que não tinham muita aptidão física o chamou.
Ele conhecia a todos, e ali no mesmo time, no mesmo tempo e espaço que a garota que ele há muito havia se interessado. Seu nome era Mariana. Era uma garota gentil, nunca havia se incomodado em conversar com Bruno ou fazer alguma atividade com ele, os dois se falavam às vezes. Loira de cabelos lisos e brilhantes, o cheiro deles, apesar de ser imperceptível para outras pessoas, para ele não era. Uma mistura de doce com possivelmente o perfume de sua pele, o cheiro humano que ele amava. Seus olhos castanhos eram profundos e perfeitos, imensos portais para um lugar que ele adoraria viver preso.
Jamais havia tocado a pele dela, talvez nunca tocaria, mas, ela era suave, o cheiro dizia tudo. Sempre desajeitada, às vezes com a maquiagem borrada. Ela não ligava pra convenções sociais de beleza. Era perfeita...
"Tudo Bem?" - perguntou Mariana.
"Ta tudo legal" - Disse seco e frio como de costume.
"Vamos"! SUAS MOCINHAS CHORONAS, PRA QUADRA JÁ! – Bradou Charles, o professor.
Bruno de cabeça baixa foi para a ponta esquerda da rede de Vôlei. Essa era a última semana de aula do ano, antes das provas finais.
A bola veio voando do lado adversário da quadra, arremessada por Marcela, uma garota que há muito tempo atazanava a vida de Mariana.
A esfera de borracha veio para o lado esquerdo, com força, como se fosse de propósito, unicamente para machucar. Mariana estava logo atrás de Bruno.
O rapaz, em um repentino ato, pulou e com aptidão e em uma explosão, rebateu a bola que foi direto de encontro à face de Marcela.
Seu nariz foi moído pela potência da bola. E logo a garota foi ao chão. O sangue escorria por seu rosto e ela chorava de dor.
***
Estava de volta em casa. Sentado em sua cama olhando para o teto. A imagem dela voava em sua mente. Essa noite seria com certeza a sua última nesta cidade. E desta vez, somente uma vez não queria ir embora. Mas teria que ir, após o que iria acontecer. Ele teria que sair da cidade com sua mãe. Só tinha uma maneira de fugir livre deste lugar com o pensamento leve.
A noite estava caindo e o sol indo embora.
Vestindo um casaco preto de moletom, por debaixo dele, uma camiseta branca lisa e velha. Jeans rasgados, surrados de aparência suja e um par de botas de motociclista pretas, as pontas eram feitas de aço.
Desceu as escadas. Sua mãe olhava para ele com medo. De braços abertos ela o abraçou. No chão ao seu lado uma corrente reforçada estava jogada.
"Boa sorte também mãe"- Disse Bruno – "Tente não destruir a casa" – terminou dando um sorriso com o canto da boca e saiu pela porta da sala.
Na varanda, Bruno olhou para a casa do vizinho. Mariana morava lá. Ele pensou mais uma vez nela e partiu para a tarefa noturna.
Seria uma longa noite. Banhada pela luz da lua cheia.
Desceu as escadas chegando à calçada, olhou para casa, uma residência simples de dois andares, com um gramado aparentemente bem cuidado, uma típica casa comum em um bairro seguro.
A cor branca mostrava uma casa recém-pintada. Bruno e sua mãe mesmo pintaram. Aquilo havia dado trabalho.
Ele mesmo sendo um rapaz gordo tinha força, talvez pela sua condição.
A noite estava fresca, possivelmente iria chover.
Esta noite nada o impediria de ter sua retaliação.
***
Aquele prédio monumental estava repleto de jovens, prontos para sua festa de final de termo, logo as férias estariam ai e consigo o fim do ano. O prédio tinha vinte e cinco andares, e um hall para convenções que desta vez fora locada para a escola da cidade. Seria uma balada de fim de ano inesquecível.
Por fora do edifício, havia estátuas de anjos, todos olhando para baixo, e sobre eles o céu agora escurecido, iria chover.
Todos se reuniam dentro do salão de festas. Marcela, mesmo com seu nariz quebrado resolveu ir. Com um vestido preto chamativo, com brilho, delineando seu corpo perfeito.
André, filho do melhor médico da cidade, estava lá também, era a tentação das garotas da escola, musculoso alto e bem de grana. Claro, seu cérebro era uma azeitona, mas isso nunca havia importado.
Ao seu lado, estava Vinicius, amigo inseparável, parceiro de colegial e claro atleta conceituado. Um perfeito panaca.
A festa corria solta. E junto dela ao lado de fora a chuva caía com peso e selvageria. Os relâmpagos no céu, refletidos nas estatuetas macabras de anjos, faziam uma cena medonha de se presenciar.
No lado norte do prédio, por trás dele em uma mata semifechada, Bruno caminhava, seu corpo estava fervendo mesmo com toda a chuva. Havia tirado o casaco e as botas. Estava na hora.
Olhou para cima e lá estava ela, encoberta por nuvens negras e assombrosas, a lua cheia o olhava com pena e rancor.
O vento forte tornava a noite fora da calorosa festa algo totalmente fantasmagórico.
Seus músculos doíam, e se contraíam. Estava começando. Ouvia leves estalos, seus ossos estavam iniciando a mutação. Precisava correr.
"Haveria esquema de segurança?" – pensou.
Então já sentindo a coisa pronta para sair, pulou por cima do muro de grades de cinco metros. Caindo dentro do prédio. Olhou por todos os lados procurando seguranças. Esquecendo-se das câmeras... ledo engano.
Parou em frente a uma janela, olhando todos aqueles que o fizeram mal, todos os malditos que o machucaram por anos e ele aguentou se acorrentando em uma árvore qualquer, resistindo ao impulso.
Agora não, não iria segurar o animal dentro de si.
Bruno tomou distância e se preparou para entrar por esta janela.
Estilhaços de vidro voando por todo o lado, enquanto os jovens olhavam a figura que surgia por entre o vidro. Todos apontaram seus dedos e riram.
Bruno olhou para cada um, para dentro deles, para a alma, o ser corrompido e sem motivo de existência que eram.
"Vocês não deviam ter mexido comigo. Machucaram o tipo de animal errado." - Disse com ódio em sua voz.
André, a frente de todos como se fosse "O Manda-Chuva" disse: "Ah, qual animal? Uma baleia?"
"Não seu idiota , isso" - falou Bruno, dando passos sem chão para trás, perdendo seu centro de gravidade e ajoelhando.
O ódio brotou, enquanto eles riam, a fúria tomou conta. Ossos partiam-se ao meio, e se moldavam para assumir a forma verdadeira, músculos se desfaziam e refaziam aumentando de tamanho. Havia sofrido uma parada cardíaca, mas não havia nem notado, seu coração havia se recuperado no exato momento no qual Wagner deveria estar morto. Seu rosto se alongava, e de sua boca sangue saia como uma cascata, dentes humanos se transformavam em facas pontudas e afiadas, mais de oito toneladas a mordida. Seus olhos se tornaram duas esferas amarelas, e suas orelhas alongaram-se, por fim uma camada de pêlos negros cobria seu corpo, os restos de sua roupa ainda prendiam-se aos membros. O monstro olhou para todos, atônitos e embasbacados sem reação. Um uivo mórbido de ódio e tristeza ecoou pelos corredores do prédio.
Em um golpe rápido, suas mandíbulas cravaram no ombro de André, levantando-o.
O monstro tinha dois metros e oitenta, e seu peso havia quadriplicado em músculos.
Ele sacodia André como um filhotinho de cão brinca com o osso de plástico. Os outros convidados da festa, desesperados corriam, gritando de medo e pânico.
Vinicius e Marcela haviam caído ao chão. Estavam imóveis, o medo e a dor da queda haviam feito com que eles tivessem que presenciar o espetáculo de terror que o monstro fazia enquanto comia a carne do rapaz que acabara de matar.
Bruno olhou para os dois caídos ao chão. Era sua noite de sorte. Partiu para o ataque. Pegando dois coelhos em uma cajadada só.
Os adolescentes haviam debandado, e a equipe de segurança estava entrando armada dentro do salão. A polícia havia sido avisada de que havia um animal raivoso dentro do recinto.
Marcela ainda estava viva, o lobo havia imobilizado-a, quebrando suas pernas.
Rápido para evitar que fosse pego.
Segurou com suas mãos fortes a cabeça da jovem e correu ao encontro dos seguranças que atiravam com pistolas automáticas. Era um erro, isso somente deixou o animal mais enfurecido, o que aumentou a força de seu ataque.
Os seguranças foram arremessados como pinos de boliche barato, chocando-se contra a parede.
O animal saiu do prédio, sendo filmado pelas câmeras de segurança.
Sua consciência, o controle humano dentro do animal imperava, Bruno havia aprendido todos esses anos se acorrentando em uma árvore como controlar o ser, e agora, homem e animal eram um só. A perfeita criatura.
E sua direção nesse momento, era para a casa de sua amiga Mariana. Ele não se importava com o que era, e sim somente com o que devia fazer, mostrar que nem ele e nem ela eram rebaixados aos desejos dos outros humanos prepotentes. E Marcela era um presente. Um presente, que o lado homem jamais daria e o lado animal, sádico e instintivo que achava a escolha ideal.
O lado humano misturado ao monstro tornava cada parte do ser em si, uma atrocidade, brutal e mortal.
A criatura, o lado bestial lutava ferozmente contra a consciência humana que ainda resistia ao instinto.
Toda lua cheia era a mesma coisa, porém ele sempre havia se acorrentado, agora sentir isso tão vivo, não sabia que doía tanto deixar a fera tomar o controle.
Correndo...
Correndo...
Tudo a sua frente era uma névoa vermelha. Por entre os quintais das casas aquele monstro atropelou cercas, varais, tudo, deixando um rastro de destruição. Ele tinha um objetivo, controlado pelo homem dentro dele. Mas imperando com a animalidade.
Agora ou nunca. No fundo sabia que após o estrago que tinha feito essa não seria somente sua última noite perto da pessoa que ele amava, mas sim seria sua última noite vivo.
O lobo estava perto do local que deveria deixar o presente. Rápido. Ele parou, estava dentro de um pequeno bosque que ficava atrás de sua casa e da casa de Mariana.
Ali ele permaneceu como se estivesse desligado. O rapaz dentro da criatura estava lá, pensando... escorrendo em sua face lupina uma lágrima.
Um uivo agora, juntando a agonia humana, a dor que sentia por não estar ali verdadeiramente. O seu lado lobo, o lado da raiva e da morte, havia entendido, compartilhava de sua dor.
Em seu quarto, Mariana acordou com medo. O uivo havia despertado aquele anjo que sonhava.
***
O lupino em um movimento bruto arremessou o corpo que trazia consigo contra uma árvore, Marcela não tinha movimentação alguma, e pouco respirava, estava prestes a morrer.
A boca da criatura se abriu, fechando a vida de Marcela eternamente. Ele havia a libertado do sofrimento.
Pois mesmo que ela não morresse, na próxima lua cheia toda a beleza e a pompa que ostentava iriam vir ao chão, e junto disso uma aberração horrível se elevaria.
A criatura correu de encontro à porta dos fundos da casa de Mariana, se arrebentando contra a estrutura, pondo tudo a baixo, junto de metade da parede.
Ele havia cruzado a linha.
E parado na cozinha da casa, olhando fixo para a entrada, Lá estava ela, olhando também, agora fixa para ele. Sentia medo, sentia vontade de correr, mas não conseguia.
O lobo ficou ali fácil de ser abatido, desarmado e fraco. A criatura.
A lua no céu estava prestes a abaixar, poucas horas para voltar a ser quem era. Precisava, tinha que durar até então.
Mostrar o que era. Um desejo.
Lobisomens eram persistentes. Bruno sabia disso. Já havia trombado com outros como ele. Piores, mesclas do animal. Amaldiçoados que se utilizavam daquilo como um dom. Para o mal, mas vagavam livres em toda a noite.
PorémEntretido, o lobo não percebeu o ato heróico do irmão e do pai de Mariana. Os dois iriam emboscar o "urso".
Repentino por trás de Bruno. Caio o irmão, veio correndo com um machado de cortar lenha.
O sangue espirrou contra a cara do seu algoz. Entretanto, o lobo não revidou, ficou ali parado. Hipnotizado.
Logo atrás de Mariana, apontando uma espingarda de caça para o "urso".
- Atira logo pai! – Gritou Caio tentando remover o machado das costas feridas do monstro.
O homem sem pensar puxou o gatilho. A coisa foi mais rápida desviando do tiro e deixando que seu outro algoz fosse pego pela saraivada de balas.
O garoto foi ao chão, largando aquele machado em suas costas. Bruno, usando o que restava de raiva e vigor em seu corpo. Estava amanhecendo, portanto o lobo estava fraco.
O machado foi lentamente saindo das costas do lobisomem. Caindo, fazendo aquele característico barulho de madeira e aço se chocando com outra superfície.
Mariana estava atônita. Não demonstrava reação à cena que acabara de presenciar. Seu irmão caído no quintal. Seu pai chorando sobre o cadáver.
Sua mãe gritava de desespero no andar de cima. E com certeza havia chamado a polícia.
Para isso o lobisomem não ligava. Não ligava para nada que fosse humano, nenhuma emoção deles, exceto as suas, a mistura de emoções - uma mistura tão perigosa quanto álcool e direção.
Os primeiros raios de sol surgiam por de trás das árvores.
Novamente, agora sentindo mais dor, a aberração retrocedia a seu estado humano. Ossos rachando novamente, moldando um corpo menor, o pêlo ia ao chão e sumia, como mágica. Os olhos..."AH" Aqueles olhos amarelos que causariam pesadelos eternos nos que sobreviveram esta noite.
O focinho ia dando lugar a um rosto, suado e sujo de sangue e poeira.
- Sou eu... – Conseguiu pronunciar enquanto voltava a sua forma humana.
- Mas... – Disse Mariana.
Ele havia controlado. Não fizera o que o animal queria, não descontou o ódio e a cólera. O coração humano vencera a batalha.
- O que é você? – Perguntou a garota.
- O que eu sou?- Eu acho estranho me perguntar isso. Você tem coração, sente dor, sente amor... você sente. Mas não está chorando por seu irmão.
- Ele era um lixo de pessoa! Teve o que mereceu.
- Eu... sou um lobisomem. – Disse olhando para o corpo do garoto fora da casa junto ao pai, com pena.
Bruno sabia que ela era uma boa garota. Doce, meiga. Pura como o mais bruto ouro que possa ser extraído da pedra. Sem mal dentro de si, sem ganância.
Mas, o pai recomposto, atacou usando do machado do filho. Ainda incrédulo de ter visto aquele monstro virar um ser humano perante seus olhos.
Bruno ainda tinha um pouco dos sentidos aguçados do monstro. Duraria até o total amanhecer.
Era uma maldição, mas era tão perfeita. Tão redonda, impassível a falhas. Exceto, a prata. Mas ainda sim contra isso ele tinha o fator do delírio que causava nas pessoas que o vissem. O medo era sua maior arma.
Sem querer matar, somente para se proteger. Ele contra atacou. Usando do resto da força sobre humana, repeliu o pai de Mariana, com um chute direto no peito do atacante que foi arremessado para fora da casa, desmaiando logo em seguida.
- Por que você não sente pena da morte de seu irmão?
- Você sentiria pena de um porco nojento que abusa de você todas as noites e você têm que ficar quieta? – Gritou, ainda sim sem perder o semblante de calma. - Você não sabe o quanto eu esperei por isso Bruno, alguém que tirasse esse inferno da minha vida.
- Por que você nunca comunicou alguém?
- Nunca teria dado certo. Meu pai eh respeitado na cidade e meu irmão era um jovem de futuro promissor.
- Você está livre agora. – Disse Bruno. – Eu preciso ir, deixar a cidade, desacorrentar minha mãe, ela também passa por isso.
- Por quê ?
- Eu fiz uma boquinha mais cedo, na festa de fim de ano do pessoal da nossa escola. Ahh..Tem lixo no seu quintal. O corpo da Marcela está jogado perto daquele arbusto ali. – Disse apontando para o local.
- Você me libertou. Eu quero estar contigocom você.
Bruno nunca havia pensando. Nunca havia imaginado que a garota que ele ama, agora, estava ao seu lado, queria estar próximo dele.
- Mariana, o quanto você esta disposta a perder para estar com um monstro?
- Você não eh um monstro. Monstro, é um pai que não ajuda a filha que sofre abuso.
- Vamos sair daqui. E sua mãe?
- Conivente. Só me tira daqui! – Gritou, deixando uma lágrima escorrer pelo canto esquerdo de seu lindo rosto.
Bruno foi calmamente até a garota abraçando-a. Olhando para os olhos, doces, e para aquele rosto. Ela era o anjo e ele o demônio.
Mariana encostou sua cabeça no peito suado do garoto. Deixando seus cabelos loiros se misturarem às folhas e sangue.
Os dois saíram da propriedade. E foram até a casa de Bruno que ficava ao lado. Teriam que sair rápido.
Bruno entrou pela porta da frente. Sua mãe estava trazendo as malas do segundo andar.
- O que ela faz aqui? – Disse Débora.
- Ela sabe mãe, eu matei o irmão dela, concordou em ir embora conosco.
- Você é um filhote doido. Mas ela sabe, compreende o risco. Então que venha.
Bruno foi junto de Mariana até os fundos da casa. Olhando o sol nascendo por completo.
Os dois seguraram as mãos. Eles sempre teriam um ao outro a partir de agora.
Seria uma vida nova para o anjo e um recomeço para o monstro.
Fonte: http://conteudoperverso.blogspot.com.br/2013/09/o-demonio-e-o-anjo.html